Blog do João Ricardo Lebert Cozac: As lições do Haiti e dos haitianos (Taeco Toma para site do Terra)

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

As lições do Haiti e dos haitianos (Taeco Toma para site do Terra)

Ainda não saímos das tragédias. Desta vez, as cenas de Haiti estampam a nossa mídia. Cenas de horror. Como aquelas que os jornais estamparam as primeiras páginas mostrando amontoados de mortos espalhados pelas ruas, nos dias seguintes à catástrofe. E também as imagens de saques e violências populares, qualificadas como "incivilidades".

As imagens colam. Haiti, graças às essas divulgações midiáticas, tornou-se sinônimo de catástrofe. Jogado ao isolamento e ao esquecimento pela França e outros impérios escravocratas, por medo da disseminação de rebeliões negras, o Haiti só é lembrado pelas suas desgraças: terremotos, furacões, golpes militares, pobreza, fome e miséria. A mídia não cessa de informar que se trata do país mais pobre das Américas.

Na ocasião da queda do governo de Jean-Bertrand Aristides, quando o ex-padre foi exilado pelos franceses e norte-americanos na África (2004), os haitianos denunciavam o preconceito da imprensa: "Não admito que o Haiti seja o país mais pobre da América; ele é o país mais empobrecido, pois, ainda hoje, guarda muitas riquezas naturais que não estão sendo exploradas, como a coragem e a determinação do povo, sua alegria, o clima, a natureza, as praias, os lugares históricos, etc.", retrucava o estudante haitiano Dudley Mocombe (Contraponto, 20/09/2004).

As atuais imagens sensacionalistas podem reforçar ainda mais o preconceito contra os haitianos. Agora, também como selvagens incivilizados, além de pobres e negros. A horda primitiva que se desperta nos momentos de extrema necessidade e de sobrevivência.

Márcio Gagliato - mais uma vez apelo às suas observações e críticas, pela suas experiências em serviços humanitários - condena a idéia, amplamente divulgada por setores da mídia de que a sobrevivência em situações como essa gera a perda de civilidade. "Não concordo com a tese de que a luta pela sobrevivência anula a civilidade", enfatiza Márcio. "Citei exemplos como o do tsunami de 2004, onde a mobilização interna surpreendeu a comunidade internacional. Relatos dos colegas que estão no Haiti estão horrorizados com esse sensacionalismo que a mídia está fazendo sobre os saques. Pelo contrário um relatório oficial e interno relata que a maioria da população haitiana está mobilizada na procura e ajuda dos sobreviventes".

Do outro lado, Pétria Chaves, da CBN lembrou em uma entrevista que a tendência das pessoas é recusar-se a ver tragédias estampadas nas telinhas e nos jornais, principalmente na época do Ano Novo, como ocorreram neste início de 2010. Vamos pensar que essa recusa não seja apenas uma negação da realidade. Porque há um exagero nas exposições das vítimas. Como Gagliato enfatizou, é importante não vitimizarmos mais ainda as vítimas. Principalmente o Haiti e os haitianos.


Taeco Toma Carignato é psicóloga psicanalista e jornalista. Doutora em psicologia social (PUC-SP) e pós-doutora em psicologia clínica (USP), é pesquisadora do Laboratório Psicanálise e Sociedade (USP) e do Núcleo de Pesquisa: Violência e Sujeito (PUC-SP).

2 comentários:

Anônimo disse...

A Imprensa manipula, isso é inegável. Mostrar só um lado da moeda é perigoso, mas pedir critério é impossível quando se busca sensacionalismo. O sensacionalismo que rege a imprensa. Ainda bem que tem gente que pensa diferente!

ricardo rossi disse...

acho que o ser humano utiliza,de forma inconsciente, desses momentos de tragédia,sofrimento e desgraça para exercitar sua pulsão de morte. São situações propicias para descarregar o peso do horror da morte de si mesmo.

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